Parlamento francês debate proibição da burca em espaço público

Portas Abertas • 7 jul 2010


O Parlamento francês começou nesta terça-feira a debater o projeto de lei do governo que inclui a proibição do uso do véu integral em espaço público no país, o que poderia transformar a França no segundo Estado europeu a vetar a vestimenta.

Os membros da Assembleia Nacional iniciaram hoje seus debates, em uma tramitação parlamentar que continuará até o dia 9 e que levará à votação do texto no dia 13 de julho, véspera da festa nacional francesa sobre os valores republicanos de um país constitucionalmente laico.

Se for aprovada --e tudo indica que sim, pelo consenso mostrado pela maioria de direita e a oposição socialista--, a França será, depois da Bélgica, o segundo país europeu a proibir o uso da vestimenta em qualquer tipo de espaço público, incluindo as ruas.

"Não é um problema de religião, é uma questão de dignidade e de transparência", disse a ministra da Justiça francesa, Michèlle Alliot-Marie, que ressaltou razões de "ordem pública" para defender o projeto de lei.

"Ninguém pode usar uma vestimenta que esconda seu rosto, isso é lógico", afirmou a ministra, em alusão ao conteúdo do texto que, após sua passagem pela Assembleia, será enviada ao Senado, onde será votado em setembro.

Alliot-Marie considerou "encorajadoras" as recentes declarações do presidente do grupo socialista na Assembleia Nacional, Jean-Marc Ayrault, sobre o compromisso da oposição de não se opor ao texto.

Os socialistas anunciaram que não se apresentarão à votação do texto, a não ser que haja modificações durante os debates, o que faz com que apenas três deputados ecologistas estejam dispostos a pronunciar-se contra, a princípio.

MULTA

Segundo o projeto de lei, em um período inicial de seis meses não serão aplicadas multas contra mulheres que cobrirem seu rosto com uma burca ou um niqab, mas, depois desse prazo, elas chegarão a 150 euro.

Quem pressionar as mulheres a sair com as vestimentas em espaços públicos podem pegar penas que chegam a um ano de prisão e multas de até 150 mil euros.

"É contrário à ordem pública social" e "um ataque à dignidade, incompatível com nossos valores constitucionais", assegurou a ministra, que reiterou que usar o véu que cobre o corpo todo e o rosto vai contra "o espírito próprio da República".

Os socialistas chegam ao debate na Assembleia depois que seu grupo na Câmara advertiu que a proibição geral da burca poderia ir contra a Constituição francesa e, além disso, poderia ter problemas práticos de aplicação.

Eles lembraram que o Conselho de Estado da França, a máxima instância administrativa do país, previu em março que a proibição geral da burca poderia não ajustar-se plenamente à lei.

Uma "proibição geral e absoluta do véu integral" poderia ser impugnada juridicamente, informou o órgão consultivo, que afirmou que a proibição traria "fortes incertezas" e seria "frágil" do ponto de vista da não discriminação.

No entanto, apesar de considerar que a proibição poderia ser inconstitucional, entendeu que a obrigação de manter o rosto descoberto "em determinados momentos e lugares" é pertinente.

MAL-ESTAR SOCIAL

A ministra Alliot-Marie se distanciou da dimensão religiosa da polêmica sobre a vestimenta que, no entanto, é usada por apenas duas mil mulheres da numerosa população muçulmana na França.

Diversas pesquisas publicadas nas últimas semanas refletem o amplo apoio dos franceses à proibição do véu integral, o que afasta a possibilidade de um distanciamento entre os parlamentares e a população sobre a iniciativa.

Antes do debate na Assembleia, a Anistia Internacional França pediu aos deputados franceses que rejeitem o projeto de lei e lembrou que muitos analistas franceses e estrangeiros alertaram que ele "contribuiria para estigmatizar a população muçulmana".

Além disso, a organização acrescentou que o "mal-estar" social que pode ser gerado pelo uso de um véu que cobre quase totalmente o rosto das mulheres "não pode ser utilizado para justificar uma restrição à liberdade de expressão".

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