Portas Abertas • 10 set 2016
Graças às orações de cristãos de todo o mundo, Asia Bibi está finalmente livre e terá um recomeço no Canadá
[Atualizado em 8 de maio de 2019]
O dia 29 de janeiro de 2019 marcou o fim de uma longa história para a cristã paquistanesa Aasyia Noreen, conhecida mundialmente como Asia Bibi. Naquela terça-feira, o Supremo Tribunal do Paquistão negou o recurso contra a absolvição da cristã pelo crime de blasfêmia. Assim, foi derrubado o último empecilho para que ela pudesse ficar definitivamente em liberdade. No entanto, em termos práticos, somente em 8 de maio de 2019 é que Asia Bibi, finalmente livre, pôde voar. Ela deixou o Paquistão e foi recebida no Canadá, onde sua família já tinha recebido asilo.
Tudo começou em 2009, quando, então com 45 anos, a trabalhadora rural, esposa e mãe de cinco filhos, Asia Bibi, foi acusada de fazer referências depreciativas ao profeta Maomé. Ela era uma empregada na fazenda de um latifundiário muçulmano. Enquanto cumpriam suas funções durante o expediente da sexta-feira, 19 de junho, Asia Bibi e suas colegas de trabalho conversavam. Asia ofereceu água para as colegas de trabalho, que não aceitaram porque, por ser cristã, Asia teria tornado o copo impuro. A conversa com as colegas muçulmanas evoluiu para assuntos religiosos e elas começaram a pressionar Asia Bibi a se converter ao islã.
Certa do caminho que seguia, a cristã rebateu as muçulmanas com frases como: “Jesus está vivo, mas Maomé está morto. O nosso Cristo é o verdadeiro profeta de Deus. Maomé não é real. Jesus morreu na cruz pelos pecados da humanidade, e Maomé, o que fez por vocês?” Tais declarações bastaram para provocar a ira e o descontrole daquelas que ali estavam e Asia Bibi foi agredida pelas mulheres que, diariamente, conviveram com ela por anos. A polícia foi chamada ao local e, mais uma vez, a lei da justiça parcial prevaleceu.
De acordo com Sohail Johnson, coordenador do ministério Sharing Life Paquistão (SLMP), “um grupo de muçulmanos torturou Asia Bibi brutalmente até a polícia chegar à cena do crime e levá-la embora”. Um boletim de ocorrência foi registrado e a cristã foi mandada para a prisão para aguardar o julgamento por blasfêmia. Sohail Johnson disse que Asia Bibi teve seu direito à fiança negado em 14 de julho de 2009. Posteriormente, ela deu a seguinte declaração: "Quando fui presa, fui agredida e molestada pelos guardas. Fiquei em estado de choque por muito tempo”.
Em 8 de novembro de 2010, após processo que durou mais de 16 meses, Asia Bibi recebeu a pena máxima, tornando-se assim a primeira mulher condenada à morte por enforcamento por crime de blasfêmia no Paquistão. Ela também foi multada em cerca de 1.000 dólares, o equivalente a dois anos e meio do salário médio de um trabalhador no Paquistão. As duas testemunhas apresentadas ao Juizado de Paz no caso de Asia Bibi não estavam sequer presentes no momento do suposto incidente. Ou seja, tais testemunhas não ouviram nem viram nada daquilo em que basearam seus depoimentos. Asia Bibi foi, desta forma, condenada pelo Tribunal de Justiça com base em provas forjadas. Ela solicitou o perdão presidencial, mas a Alta Corte de Lahore proibiu o presidente Asif Ali Zardari de concedê-lo, atendendo à petição do cidadão Shahid Iqbal, o acusador. Asia permaneceu na prisão em Sheikhupura, onde lhe era permitido receber a visita da família uma vez por semana.
O governador da província Punjab, Salmaan Taseer, era um dos advogados mais veementes de Asia Bibi e um oponente das leis de blasfêmia do país. Em 04 de janeiro de 2011, ele foi assassinado por seu guarda-costas. O apoio de Taseer para a libertação de Asia Bibi fez dele um alvo para os extremistas islâmicos. De acordo com Warren Throckmorton, que começou uma petição nos Estados Unidos exigindo a libertação da cristã, Taseer teve uma fátua – uma decisão religiosa ou, no caso, uma ordem para matar – sobre sua cabeça.
Depois do assassinato do governador de Punjab, a gravidade da ameaça à vida de Asia Bibi aumentou, a ponto de ela ter que ser transferida do distrito de Sheikhupura para uma prisão feminina em Multan, já que sua vida corria perigo onde estava. Kashif Mazhar, o porta-voz sênior da Life for All, declarou à imprensa que "é bom transferirem Asia, mas isso deve ser confidencial, pois os extremistas estão à procura de uma oportunidade para matá-la. Ela deve ser levada em um helicóptero, já que o assunto é extremamente sério". O marido de Asia Bibi, Ashiq Masih, e a comunidade cristã afirmaram que havia ameaças constantes de militantes e recompensas sendo anunciadas em todo o Paquistão para quem a matasse.
Em abril de 2011, Asia Bibi adoeceu devido às más condições da prisão. Ela contraiu varicela devido às precárias condições de higiene em que estava sendo mantida. Haroon Barket Masih, presidente da Fundação Masih, que providenciou assistência jurídica e financeira para a cristã, emitiu um comunicado que dizia: “Asia Bibi foi diagnosticada com varicela. Ela está sendo mantida em uma solitária por mais de três meses. Estamos preocupados com sua saúde, porque ela passa 24 horas por dia trancada na cela. Ela necessita de cuidados médicos e condições decentes de higiene e saúde. Apesar de sua debilidade física, ela jejua e ora por todos, não se importando com sua saúde. Até agora, ela não foi atendida por um médico.”
Em 22 de julho de 2015, a Suprema Corte do Paquistão decidiu ouvir o caso dela. A justiça decidiu nas liminares suspender a pena de morte. Essa ordem da Suprema Corte abriu o caminho para sua possível absolvição completa, pois poderia ser libertada com o pagamento de uma fiança. Mas devido à sensibilidade do caso e por questões de segurança, Asia Bibi permaneceu na prisão, esperando o julgamento final do Supremo Tribunal Federal. Durante os anos de prisão, ela foi maltratada, torturada e esteve doente várias vezes. Seu marido e filhos tiveram que fugir de retaliações de extremistas islâmicos. A luta continuou, com militantes islâmicos querendo sua morte e ameaçando aqueles que tentavam ajudá-la. Desde essa época, alguns especialistas já previam que, se ela fosse absolvida, tanto ela quanto os advogados e o próprio juiz teriam que deixar o país imediatamente, porque os muçulmanos radicais buscariam vingança, o que também deixaria a minoria cristã totalmente vulnerável.
Em 13 de outubro de 2016, Asia Bibi voltou a julgamento no Supremo Tribunal do Paquistão. Ela teve a oportunidade de se defender novamente sobre a acusação de blasfêmia. Mas o novo juiz que assumiu a mais alta corte do país anunciou publicamente que pretendia manter a pena de morte de Asia Bibi, visto que todos os envolvidos no julgamento enfrentam pressão extrema por parte dos radicais islâmicos.
O jogo só começou a virar favoravelmente para Asia Bibi quando a União Europeia começou a intervir, em fevereiro de 2018. O enviado especial para liberdade de religião e crença da União Europeia, Ján Figel, visitou o Paquistão e, durante a visita, disse a oficiais paquistaneses que a renovação dos contratos de exportação para a Europa dependia da libertação de Asia Bibi. Em um comunicado oficial no começo do mês de fevereiro, a União Europeia já tinha afirmado que a renovação do status do Paquistão como um parceiro comercial privilegiado estaria ligada ao resultado do caso da cristã perseguida por sua fé.
Foi somente em 8 de outubro de 2018 que a Suprema Corte do Paquistão, na capital Islamabad, finalmente ouviu o muito adiado apelo de Asia Bibi. No entanto, o julgamento foi reservado e a decisão só foi anunciada em 31 de outubro. Assim, foi nesse dia que a Suprema Corte do Paquistão determinou a soltura imediata de Asia Bibi, afirmando que a acusação falhou em apresentar provas acima de qualquer suspeita.
No entanto, alguns dias antes, Khadim Hussain Rizvi, líder do grupo extremista Tehreeq Labek Pakistan (TLP), convocou em um vídeo todos seus seguidores para sair às ruas e estar prontos para morrer caso o veredito fosse favorável a Asia Bibi. O partido de Rizvi questionou a absolvição de outubro e anunciou uma fátua (pronunciamento legal emitido por especialista em lei religiosa) que colocou um preço pela cabeça dos juízes que ouviram o caso, vários ministros do governo e o primeiro-ministro Imran Khan. A polícia paquistanesa e forças de segurança prenderam mais de 3 mil militantes em um esforço de proteger Asia.
A absolvição da cristã desencadeou uma onda de protestos dos radicais islâmicos em todo o país. Escritórios e escolas foram fechados e os cristãos começaram a ser ainda mais ameaçados e discriminados. A reação da cristã ao saber do veredito foi: “Eu não acredito no que estou ouvindo. Vou sair agora? Eles vão me soltar mesmo? Não sei o que dizer, estou muito feliz, não acredito nisso”, informou a AFP.
No dia 2 de novembro de 2018, o governo do Paquistão anunciou um acordo de cinco pontos com os extremistas responsáveis pela maioria dos protestos em todo o país. No acordo, o governo prometeu não se opor à petição por uma revisão legal da absolvição de Asia e a que o nome dela fosse colocado na Lista de Controle de Saída, que contém os nomes das pessoas que não podem deixar o país.
O governo também se comprometeu em agir contra as possíveis mortes e prisões de manifestantes, garantindo que os presos fossem liberados imediatamente. Em contrapartida, o Tehreeq Labek Pakistan (TLP, grupo responsável por instigar os protestos) convocaria seus seguidores a parar as manifestações e se desculpar àqueles que passaram por “inconvenientes” devido aos protestos. No dia seguinte pela manhã, a maioria dos protestos já havia acabado e os serviços telefônicos sido restaurados. Um comitê de revisão jurídica foi formado para revisar a decisão da Suprema Corte, abrindo a possibilidade de o veredito ser revertido diante da pressão por parte dos extremistas.
Em 29 de janeiro de 2019, a Suprema Corte do Paquistão decidiu negar o pedido de apelação contra a absolvição de Asia Bibi e ela foi definitivamente declarada livre. Em 1 de fevereiro de 2019, o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, revelou que o país ofereceu asilo à Asia e seu marido e a proposta teria sido aceita pela família. As filhas do casal, de 18 e 19 anos, já estariam no Canadá desde antes do Natal, com uma família amiga.
Nos dois meses após a corte paquistanesa tornar sua decisão pública, em 31 de outubro de 2018, as filhas de Asia e amigos da família se mudaram três vezes para vários lugares secretos no Paquistão, enquanto seguidores de Khadim Hussain Rizvi (líder TLP, Tehreek Labek Pakistan), os procuravam de casa em casa para matá-los. Nos meses seguintes à sua absolvição, Asia Bibi continuou no Paquistão sob proteção do governo. Somente em 8 de maio de 2019 é que a cristã pôde, finalmente, deixar o país rumo ao Canadá, para reunir-se à sua família. Um novo capítulo, enfim, começa para nossa irmã Asia Bibi. Louve a Deus por essa grande vitória e continue a orar por ela.
Pedidos de oração
© 2024 Todos os direitos reservados