Portas Abertas • 26 mar 2021
O governo alterou a Constituição em 1988, tornando o islamismo a religião oficial do país
O povo de Bangladesh é experiente na luta por liberdade. Apenas no último século, ele foi perseguido e oprimido por governantes estrangeiros e compatriotas. Além de lutar pela independência, o povo bengalês também lutou para falar em sua língua materna, o bengali, língua que deu nome ao país. Em 26 de março de 1971, Bangladesh conquistou a independência do Paquistão, porém, cristãos locais continuam sem liberdade para seguir a Jesus.
Sob o domínio do Império Britânico, o país hoje conhecido como Bangladesh era apenas uma parte da Índia. Em 14 e 15 de agosto de 1947, com o fim do domínio britânico, a Índia foi dividida em dois países, Índia e Paquistão. Bangladesh, na época, fazia parte do Paquistão. Os países foram divididos de acordo com linhas religiosas. A maioria dos hindus passou a viver na área que se tornou a Índia, enquanto a região com maioria muçulmana se tornou o Paquistão.
Ao ser criado, o Paquistão era composto de duas partes: a Ocidental (atual Paquistão) e a Oriental (atual Bangladesh). Entre as duas áreas havia cerca de 1,6 mil quilômetros de território indiano. Além da separação geográfica, havia também uma divisão cultural. Na parte Ocidental a maioria falava urdu, enquanto na Oriental, a predominância era de fala bengali. Na época da separação, cerca de 75 milhões de pessoas viviam no Paquistão Oriental, comparado com os 55 milhões do Paquistão Ocidental. Mesmo com menor população, a área Ocidental mantinha maior poder econômico e político.
O Paquistão foi formado com grandes esperanças, além da expectativa de paz e liberdade. Porém, as pessoas que viviam na região atual de Bangladesh logo perceberam que haviam conquistado a independência britânica, mas não do Paquistão Ocidental. Nessa época, líderes políticos tentaram unir as duas províncias sob uma mesma língua. Por isso, em 1948, escolheram o urdu, língua no Paquistão Ocidental, como a língua oficial para ambas as províncias, tentando forçar os habitantes do lado Oriental a usá-la.
Shaheed Minar é um monumento de lembrança aos mártires que deram a vida pelo direito de falar bengali, em 1952
Entretanto, aqueles que falavam bengali rejeitaram a proposta. Estudantes, professores e outros membros da população marcharam pelas ruas para exigir que o bengali fosse a língua oficial do Paquistão, já que eram a maioria. Porém, os líderes do Paquistão Ocidental não se convenceram. Em 21 de fevereiro de 1952, os militares foram orientados a controlar os protestos na área Oriental, matando diversas pessoas e ferindo centenas de outras. Atualmente, no dia 21 de fevereiro é celebrado o Dia da Língua Materna em Bangladesh, em memória dos que deram a vida pelo direito de falar bengali.
Depois disso, o conflito cresceu entre as duas províncias chegando ao auge na noite de 25 de março de 1971. Na ocasião, o exército da parte ocidental atacou aqueles que apoiavam a independência do Paquistão Oriental. Houve também a prisão de Sheikh Mujibur Rahman, líder do partido político Liga Popular de Bangladesh, que tinha recebido grande apoio nas eleições de dezembro de 1970.
Então em 26 de março de 1971, o Sheikh Mujibur Rahman declarou o estado independente de Bangladesh, dia em que é comemorada a independência do país. Depois de nove meses de uma guerra sangrenta, que levou à morte de milhões de pessoas, a Guerra da Independência de Bangladesh chegou ao fim em 16 de dezembro de 1971, com o Paquistão Ocidental se rendendo. O nome Bangladesh veio da junção do nome da língua local “bangla” e “desh”, que significa “país”.
Paquistão Ocidental assinando a rendição em 16 de dezembro de 1971
Quando a guerra pela independência começou, os cristãos lutaram pela liberdade do país. Alguns atuaram de forma direta no combate, mas outros agiram de forma indireta. Muitos não cristãos se abrigaram em missões cristãs. As missões ofereciam abrigo, comida e assistência médica. Mas nem sempre a fé os protegeu. Vilas cristãs foram incendiadas e alguns cristãos torturados e mortos por ajudarem combatentes da liberdade.
A história do cristianismo no Sudeste Asiático é muito antiga. De acordo com a história da igreja, o apóstolo Tomé chegou à Índia no primeiro século depois de Cristo. Acredita-se, porém, que missionários católicos portugueses e comerciantes introduziram o cristianismo na área agora conhecida como Bangladesh no final do século 16 e começo do século 17.
Em 1577, o imperador mongol Akbar permitiu que os portugueses construíssem igrejas na região. Como resultado, alguns portugueses se casaram com locais, gerando os primeiros cristãos locais. Quanto ao edifício, a primeira igreja em Bangladesh foi uma católica construída em 1599, em Chandecan, na cidade de Jessore.
Em 1740, cristãos protestantes chegaram na área conduzidos pelo reverendo John Zachariah Kiemander, que estabeleceu uma igreja protestante, em 1757. Porém, o missionário inglês William Carey é, com certeza, o mais conhecido missionário que trabalhou na região. Ele chegou a Serampore em 1793. O cristão traduziu e publicou a Bíblia em bengali, o primeiro dicionário na língua local, além de ajudar a estabelecer um sistema escolar.
Embora o cristianismo exista no país há centenas de anos, o número de cristãos historicamente é muito pequeno.
Mapa mostra as religiões na área que inclui o território de Bangladesh em 1909, com a maioria muçulmana destacada em verde
Missionários cristãos estabeleceram muitas escolas, faculdades, hospitais e outras instituições. Isso permitiu que trabalhassem para cuidar de pobres e necessitados, bem como apoiar o empoderamento de mulheres e os direitos das crianças. Foram eles que trouxeram a prensa de impressão para a região e proporcionaram mudanças revolucionárias nas áreas da educação e da saúde. Por causa de seus cuidados, são sempre bem recebidos por não cristãos em Bangladesh.
Quando houve a divisão entre Índia e Paquistão, em 1947, isso promoveu a ideia de que o Paquistão, que incluía Bangladesh na época, era um país para muçulmanos. Cristãos eram a minoria e essa divisão religiosa reforçou ainda mais a ideia de não pertencimento dos cristãos.
Em 1956, quando Bangladesh ainda era parte do Paquistão, o país se tornou uma República Islâmica, tornando o islamismo uma fonte de legislação e a base da identidade nacional. A sharia (conjunto de leis islâmicas) foi implementada, marginalizando cristãos e resultando em intensa perseguição. Após a independência de Bangladesh, as atividades religiosas se tornaram mais abertas. O país foi declarado um Estado secular e, pela Constituição, as pessoas tinham o direito de praticar a fé livremente. Esse direito constitucional permitia que cristãos trabalhassem de forma mais livre e ampla.
O reverendo Michael Kamol Adhikari explicou: “Nós temos o direito constitucional de praticar a fé livremente, porém, em alguns casos, nós não podemos fazê-lo, porque a realidade é um pouco diferente. No começo do país, havia muita oportunidade para a prática da fé, mas alguns anos depois, quando o exército tomou o poder após o assassinato do Sheikh Mujibur Rahman, a oportunidade acabou”.
O exército tomou o controle do país em 1975, após a morte do presidente Sheikh Mujibur Rahman, considerado o “Pai de Bangladesh”. Para aumentar o apoio do exército, os comandantes utilizaram o sentimento religioso. O governo alterou a Constituição, tornando o islamismo a religião oficial do país em 1988. Ao invés de ser secular, Bangladesh se tornou um país muçulmano.
Sheikh Mujibur Rahman, que assinou a independência de Bangladesh, foi o primeiro presidente e é considerado o pai da nação
A ênfase da política na religião resultou no aumento da intolerância no país. Aos poucos, a utilização do sentimento religioso se tornou uma grande ferramenta para conseguir votos da população de maioria muçulmana. Atualmente, cristãos são vistos como uma ameaça aos muçulmanos, mais do que qualquer outra religião. Isso acontece porque é raro um muçulmano se tornar hindu ou budista, porém é mais comum ouvir sobre muçulmanos que se tornaram cristãos.
Além disso, estudiosos muçulmanos falam negativamente sobre o cristianismo e a Bíblia, o que constrói uma visão negativa dos cristãos na sociedade. Apesar dessa visão negativa, o reverendo Adhikari conta: “Cristãos e missionários têm um grande papel em Bangladesh. Muitas organizações e instituições cristãs desempenham papel no desenvolvimento do país. Ninguém pode negar isso”.
Muitos se convertem mesmo frente à perseguição. O parceiro local da Portas Abertas, Irmão Abraham, disse: “As pessoas que se tornam cristãs crescem gradualmente em número e fé. Alguns vêm à Cristo por meio de evangelistas locais, outros por meio de amigos, membros da família, vizinhos ou mesmo por meio de seminários e conferências”.
O parceiro conclui dizendo: “Deus está realmente trabalhando em Bangladesh, principalmente entre cristãos ex-muçulmanos. Há muitos muçulmanos sedentos. Mesmo em meio à perseguição, as pessoas querem saber sobre Jesus e finalmente passam a segui-lo. Deus também está levantando líderes locais entre cristãos ex-muçulmanos. Eles são muito engajados em compartilhar o evangelho. Isso só é possível porque Deus está trabalhando para derramar sua graça salvadora sobre essa nação”.
Por meio de suas orações e contribuição, você ajuda a fornecer um poço artesiano para uma família cristã no país.
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