Portas Abertas • 16 nov 2006
Todos os anos, centenas de missionários, a maior parte do Reino Unido e da Irlanda, se apresentam como voluntários para levar textos cristãos e a Bíblia para a China. Esther Davenport descreve uma das muitas vezes em que ela vivenciou uma bênção de Deus durante uma travessia de fronteira. Ela diz: "Me pergunto se pode existir um privilégio maior do que levar as palavras preciosas do amor e da vida eterna do Senhor aos seus queridos filhos da China".
Éramos quatro mulheres atravessando a fronteira naquele dia: uma galense, uma norte-americana e duas inglesas. No dia anterior, nós havíamos entregado centenas de Bíblias e de materiais de treinamento com êxito. Essa era para ser a minha última viagem antes de retornar para casa e, como eu estava liderando o grupo, decidi que atravessaria por último, para garantir que minhas companheiras de viagem atravessariam a salvo.
O ônibus no qual estávamos viajando despejou os passageiros no posto de controle da fronteira. Nós quatro éramos as únicas pessoas do ocidente a bordo. Enquanto a fila ia andando para dentro do prédio, vi que as minhas amigas estavam sendo paradas uma por uma e que suas malas estavam abertas no balcão da alfândega.
Carga preciosa
Em cada mala havia uma variedade de Bíblias, livros de treinamento, hinários e Bíblias infantis. Os funcionários da alfândega ficaram perplexos. Um deles abriu uma Bíblia infantil, mas percebi em sua expressão que ele não tinha reconhecido que era uma Bíblia. Mas o chefe alfandegário começou a ficar agitado. Ele não conseguia entender por que tantos livros estavam sendo transportados de uma só vez.
Eu continuei andando, com a esperança de que eles me deixariam passar. Um funcionário me chamou, gesticulando para que eu colocasse minha mala preta no balcão, assim como a minha bolsa cinza de nylon na qual eu carregava apenas alguns itens pessoais.
O oficial chefe ainda estava agitado por causa dos livros que as outras três mulheres estavam levando, mas ele estava ansioso para se livrar do que, obviamente, estava se tornando um problema. Ele fez um gesto com a cabeça para que fechassem as malas e, olhando para as mulheres, disse: "Vai, vai" e acenou para elas. Eu pensei: "Senhor, espero que ele faça o mesmo comigo".
O oficial chefe checou a minha bolsa cinza primeiro, mas ele não estava interessado nessa bolsa e voltou sua atenção para a mala preta. O único conteúdo da minha mala eram 14 Bíblias bem grandes que estavam destinadas aos pastores.
Aquilo foi demais para ele. Ele levantou duas das bíblias, uma em cada mão, voltando a ficar agitado. "Há apenas livros nessa mala e todos eles são iguais. Por que eles são todos iguais?" Ele continuou perguntando e começou a andar, inquieto. Ele estava com o meu passaporte nas mãos e ficou abrindo e fechando o documento. Ele começou a discutir a situação com outros oficiais.
A soberania no encontro
Enquanto isso estava acontecendo, um funcionário mais jovem veio até nós. Ele me destratou, olhou minha mala e pegou uma Bíblia. Um ar solene tomou conta de seu rosto ao abrir a Bíblia. Observei cuidadosamente suas feições enquanto ele começava a ler e um sorriso foi se espalhando, lentamente, em seu rosto. Ele repousou sua mão no lado direito da página e começou a virar a página com muita ternura, da direita para a esquerda. Por alguns momentos, ele estava tão concentrado que parecia que não havia mais ninguém lá.
Então, o ouvi sussurrar: "Livro bom, livro bom". Mas ele pareceu ter repensado nas palavras que acabara de dizer. Ele fechou a Bíblia cuidadosamente e guardou-a na mala.
O chefe da alfândega começou a dar instruções e, depois, foi embora, levando meu passaporte. De repente, a sala da alfândega esvaziou. Os outros oficiais acompanharam o oficial chefe para fora da sala. Olhei para o oficial mais jovem, sorri e disse: Será que ouvi o senhor dizer livro bom?". Ele balançou a cabeça e sorriu para mim. Mostrei a ele a cruz que eu trazia e falei: "Sou cristã; você é?". Ele olhou, rapidamente, para os lados para garantir que não tinha ninguém por perto. Ele sorriu novamente, balançou a cabeça e disse: "Sou sim". Apertei sua mão e falei: "Prazer em conhecê-lo, irmão".
Missão arriscada
Eu disse: "Irmão, preciso levar algumas dessas Bíblias para o outro lado da fronteira, não posso perder todas. Será que o senhor poderia olhar para o teto por um instante? Dessa forma o senhor não veria o que estou fazendo e não poderia ser responsabilizado". Ele sorriu e ficou olhando para cima.
Rapidamente, peguei a mala, tirei uma Bíblia e a coloquei na mala cinza que ainda estava no balcão. Peguei mais seis e coloquei na mala. Quando fui pegar mais uma ele disse: "Por favor, sou um oficial alfandegário". Entendi sua preocupação.
A porta no final do corredor se abriu e o oficial chefe voltou para a sala. Em um breve momento, pude ver a preocupação no semblante do jovem oficial, que também se refletia em mim, porque a mala estava mais vazia e o oficial, que estava se aproximando do balcão, iria perceber.
O oficial mais jovem fechou a tampa da mala e começou a fechar o zíper. Eu estava agitada, tentando fechar o zíper da mala cinza. Não tive tempo de colocar as Bíblias direito e, por isso, as pontas das bíblias estavam sobressaindo da mala. A mala estava saliente na costura.
Lembro-me de ter pensado: "Senhor, ele terá que ser cego para não notar a diferença no formato e nas saliências da mala, que estava praticamente lisa quando ele saiu". Eu orei: "Senhor, não deixe que ele perceba".
O oficial chefe falou com o mais jovem, obviamente dando-lhe instruções. Ele acenou para mim: "Ela pode ir, mas os livros não podem ir com ela". Ele entregou meu passaporte para o oficial jovem e me dispensou.
Com o oficial mais jovem, andei até um prédio menor. Lá, havia duas chinesas. Ele colocou a mala no chão e abriu, revelando as sete Bíblias. O medo tomou conta de mim quando uma das mulheres viu minha mala cinza, que eu tinha colocado na cadeira. Ela insistiu em analisá-la, mas, novamente, o oficial meu ajudou: " A mala cinza foi liberada na alfândega. Não tem nada de errado com ela. Somente o conteúdo da mala preta não foi liberado para cruzar a fronteira".
Pedido de ajuda
O oficial mais jovem pegou a mala cinza, colocou dentro da outra mala e a colocou do outro lado da porta onde eu podia ver, mas as duas mulheres não.
Fui até o estacionamento procurar o ônibus, mas ele já havia partido. O motorista não me esperou. Procurei por ajuda ao meu redor, mas só havia o oficial chefe e o mais jovem por perto. Eu os chamei. O mais jovem correu até mim e disse que chamaria um táxi.
Entrei no táxi e ele se ajoelhou ao lado da porta, pegou minha mão e disse bem baixinho para que o motorista não ouvisse: "Por favor, você deve voltar e trazer mais Bíblias". Olhei para aquele rosto gentil e sorridente e disse: "Irmão, prometo voltar e trazer mais Bíblias. Deus o abençoe pelo que você fez hoje".
Adaptado de "The Cry of Our Brothers" ("O choro dos nossos irmãos"), escrito por Esther Davenport.
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