Portas Abertas • 6 mar 2006
Uma jovem cristã, desaparecida há mais de um mês, telefonou para os seus familiares e contou que está presa em um apartamento no Cairo, sendo pressionada a se converter ao Islamismo. Theresa Ghattass Kamal, vista pela última vez em 3 de janeiro, na aldeia de El-Saff, 30 milhas ao sul da cidade do Cairo, fez um breve contato com sua tia em 24 de janeiro. Theresa contou que ainda não havia sucumbido diante das exigências desconhecidos seqüestradores, para que ela se torne uma muçulmana, informou ao Compass o irmão dela, Saeed Ghattass Kamal.
O telefonema de Theresa contradisse as declarações da polícia de que ela havia se convertido ao Islã voluntariamente e que não queria ver sua família de novo. A polícia fez as alegações em janeiro, durante uma vigília de três dias de protesto realizada pelo clérigo e membros da Igreja Ortodoxa Copta.
Uma investigação adicional, promovida por Saeed Kamal, revelou que não existia nenhum registro oficial da conversão de sua irmã no centro islâmico Al-Azhar, no Cairo. A lei egípcia exige que todas as conversões sejam registradas em Al-Azhar e, então, validadas pela polícia de segurança, chamada Investigação de Segurança do Estado (ISE).
A família Kamal rastreou o local de origem da ligação da jovem de 19 anos e identificou um apartamento em Shubra, distrito do Cairo, pertencente a um muçulmano chamado Mostafa Mahmood Ali.
Um sacerdote local caracterizou a casa de Ali como "um lugar perigoso, cheio de fundamentalistas". Saeed Kamal e um advogado da diocese de Shubra denunciaram Ali à seção do ISE desse distrito. Quando o cristão Saeed retornou em 30 de janeiro, a polícia o informou, por meio de um telefone localizado numa sala de espera, que eles haviam interrogado Ali e que ele não estava com a jovem cristã. A polícia se recusou a falar com Saeed Kamal pessoalmente.
Desaparecimento
Nascida em Wadi El-Natroun, a noroeste do Cairo, Theresa Kamal, 19, estava morando em um apartamento para mulheres, pertencente à Igreja em Giza, e fazendo um curso na Academia de Secretariado no Cairo antigo. O pai de Theresa se converteu ao Islã em 1995, e sua mãe faleceu em 2003. Ela e seus quatro irmãos passaram a sobreviver por conta própria.
Em 3 de janeiro, ela fez uma visita ao sacerdote da Igreja Ortodoxa Copta, Bavley William, na aldeia de El-Saff, e pediu a ajuda dele para renovar suas identificações nacional e estudantil. Ela havia perdido os documentos quando pegava um ônibus.
William encorajou a jovem cristã a retornar a Wadi El-Natroun para fazer a solicitação de sua identidade, e lhe deu algum dinheiro para ajudar a cobrir a despesa. Então, Theresa telefonou para seu irmão e falou que estaria de volta no dia 5 de janeiro, pela manhã, o mais tardar.
Como sua irmã ainda não havia retornado para casa dia 6 de janeiro, Saeed Kamal viajou até Giza e El-Saff para procurá-la. A polícia de ambas as cidades se recusou a registrar um boletim de ocorrência de pessoas desaparecidas, e mandou que ele voltasse para Wadi El-Natroun a fim de registrar o desaparecimento de sua irmã.
Em um relatório do desaparecimento da jovem cristã do dia 10 de janeiro, a polícia de Wadi El-Natroun declarou que, primeiramente, "solicitariam um relatório do Departamento de Investigação sobre este caso".
Temendo que o governo continuasse sem agir, 150 cristãos, incluindo os três sacerdotes da Igreja Ortodoxa Copta, iniciaram um protesto pacífico de três dias em 11 de janeiro, do lado de fora da delegacia da aldeia. Liderada pelo sacerdote Yahnoss Kama, pelo sacerdote Botross, da paróquia de Wadi El-Natroun, e pelo sacerdote Bavley, da paróquia da cidade de Khatatba, a congregação ortodoxa local exigiu o retorno de Theresa Kamal.
No terceiro dia, o oficial Tarek Haykal, do ISE, prometeu aos manifestantes que Kamal retornaria à sua família, e que eles poderiam encontrá-la em seu escritório em Demnhoor, capital da província de Buhayarah, em 17 de janeiro. Alegando falar em nome do diretor do ISE, no Cairo, Hassan Abdul Rahman, Haykal também ameaçou prender os três sacerdotes, se eles não se dispersassem imediatamente.
Mas, de acordo com Saeed Kamal, em seu encontro com o oficial, em 17 de janeiro, Haykal o amaldiçoou, o insultou, e em seguida, o expulsou do escritório. Haykal contou aos sacerdotes da paróquia de Demnhoor, acompanhantes do cristão, que Theresa havia se convertido ao islã no dia do seu desaparecimento, e que ela recusava a voltar para sua família.
Haykal disse que agendaria um encontro entre Theresa Kamal e um sacerdote, um pré-requisito obrigatório para conversão legal no Egito.
Após checar os registros de conversão no centro islâmico Al-Azhar, e os diretórios de segurança no Cairo e em Giza, Saeed Kamal descobriu que a suposta conversão de sua irmã nunca havia acontecido.
A cumplicidade da polícia
Registros de seqüestros e conversões forçadas de garotas cristãs são comuns na comunidade copta egípcia. Algumas dessas garotas, encantadas por jovens muçulmanos, abandonam voluntariamente suas casas e se convertem ao islamismo para fugir da situação de pobreza e infelicidade de suas famílias.
Mas "há registros confiáveis de que as autoridades governamentais têm falhado em cooperar suficientemente com as famílias cristãs na tentativa de recuperar a guarda de suas filhas", informou o Departamento do Estado Americano em seu último Relatório Internacional sobre Liberdade Religiosa anual no Egito.
Sem a cooperação da polícia, as famílias encontram dificuldade para verificar os motivos para cada conversão. A menos que o convertido seja menor de 18 anos, idade legal para a conversão, a polícia pode se recusar a reaver mulheres desaparecidas com a alegação de que elas não querem ver suas famílias.
A situação de Theresa é incomum, pois ela foi capaz de entrar em contato com sua família e negar os relatos de conversão voluntária. Tem sido mais fácil do que o normal ver a cumplicidade da polícia neste caso, "porque Theresa pôde contar a sua tia que ela está no local de onde estava ligando", um dos advogados sediados no Cairo comentou. "Mas tudo o que os oficiais fizeram em resposta foi informar ao irmão dela que ela não estava lá".
Os cristãos coptas correspondem a, pelo menos, 10% da população egípcia. Como a conversão de muçulmanos ao cristianismo é ilegal, "conversões por meio de seqüestros" ao islã tem sido, há muito tempo, matéria de debate no país.
Em dezembro de 2004, milhões de cristãos coptas no Cairo, fizeram um protesto quando Wafaa Constantin, a esposa de um sacerdote da província de Bahayrah, supostamente se converteu ao islã e fugiu com um muçulmano. Wafaa Constantin foi devolvida à custódia da igreja pelas forças de segurança egípcia.
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