Portas Abertas • 12 jul 2006
Um pouco antes da crise causada pelo seqüestro de um soldado israelense, a Portas Abertas Internacional visitou a Faixa de Gaza. Nessa área de poucos 360 quilômetros quadrados, a Portas Abertas descobriu uma atração pelo extremismo e um ciclo de ódio difícil de transpor. Em um único dia na vida comum de Gaza encontramos um protesto contra a fome, o som de bombas caindo e crianças que não conseguem se perdoar.
Não muito longe da fronteira com Israel, centenas de manifestantes se reuniram. Eles carregavam quadros e placas com frases como: "Os Estados Unidos devem assumir suas responsabilidades judiciais e morais" e "Não estamos a favor do Hamas, não estamos a favor da Fatah, estamos com fome". Um dos líderes do grupo falava em um microfone, mas os manifestantes (todos homens, as mulheres ficaram no ônibus) estavam mais interessados no nosso pequeno grupo de estrangeiros. Eles pularam na frente de nossas câmeras e puxaram nossos braços, para terem certeza de que víamos seus rostos sofridos e suas placas. É por isso que eles estão protestando: pela atenção do mundo lá fora.
O centro da cidade de Gaza estava caótico também. Os combatentes do Hamas (reconhecíveis por seus uniformes verdes, pelos rifles e pela barba) e os agentes da Fatah (de uniformes azuis, armados também, mas sem barba) patrulhavam as ruas. Os táxis estavam por todo canto. As lojas estavam cheias de pratarias, candelabros, brinquedos, lembrancinhas e muito mais. Os donos das lojas poderiam ficar o dia todo à espera de clientes que não pareciam. "As pessoas não têm que fechar suas lojas quando elas não vendem nada", disse Salim (pseudônimo), o palestino que nos serviu de guia. "Ninguém pediu falência. As pessoas pedem dinheiro emprestado ou vendem móveis para sobreviver."
Desde o segundo levante em 2000, Gaza está isolada. Os cidadãos compreendem pouco as medidas de segurança de Israel. Muitos muçulmanos "se refugiaram" no Alcorão e nas mesquitas. O resultado foi visto na vida cotidiana. Muitas mulheres estão vestidas das cabeças aos pés. "No pátio das escolas, o resultado também é visível" disse Amin, um cristão que trabalha com crianças nas escolas. "O senso de honra está bem enraizado nas crianças. O pior que lhe pode acontecer é ser agredido por alguém. Isso é muito humilhante. Você tem que se vingar com seus amigos. Se você brigou com alguém, deve continuar a brigar. As crianças em Gaza não conseguem se perdoar, nem mesmo pelos menores erros. E por que não? Porque eles não ouvem a Palavra de Deus. A linguagem do amor não é falada aqui. Em nossos trabalhos, falamos sobre amor e perdão. Gradualmente, pode-se ver a mudança."
Os poucos cristãos que vivem em Gaza querem sair de lá o mais rápido possível, disse o pastor batista Hanna Massad. Sua esposa, Suhad dirige uma livraria na cidade de Gaza, patrocinada pela Portas Abertas. Hanna disse que os problemas econômicos e políticos também afetam os cristãos. "Nós, como cristãos, não podemos ficar em destaque. As mulheres cristãs se vestem só um pouquinho diferentee estão sujeitas à censura".
Suhad, sua esposa, conta que um dia elas estava indo a pé para o supermercado. Quando dois homens muçulmanos viram que ela usava uma camisa com mangas curtas, começaram a orar. Ela diz: "Às vezes as pessoas dizem para nós sairmos de Gaza. Elas acham que palestinos não podem ser cristãos."
Hanna diz que eles prestam bastante atenção sobre como falam do evangelho, e com quem falam. "Vivemos sob pressão, e a ameaça de uma explosão sempre está presente. No começo deste ano tivemos que fechar nossa livraria por alguns dias, depois que duas bombas explodiram." (Leia esta notícia aqui).
Quando saímos de Gaza, escutamos um som como de trovão ao longe. "Temos medo de bombas", disse Salim, o guia. Conforme ele, "Israel joga bombas na terra de ninguém só para assustar as pessoas". Mas ninguém olha para a direção de onde o barulho vem. Quando chegamos à fronteira, Salim olhou para Gaza. "Dizemos em Gaza que amanhã as coisas estarão melhor." Mas, quando será amanhã? "Em Gaza, o amanhã nunca chega."
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