Portas Abertas • 14 fev 2024
Apesar de todos os riscos, Saleh não deixa de ser um raio de esperança para outros cristãos no Iêmen (foto representativa)
Saleh* nem sempre esteve na lista dos mais procurados do Iêmen, afinal ele nem mesmo nasceu em uma família cristã. Os pais dele não eram muito religiosos ou rígidos, e a infância dele foi vivida em uma casa secular. O interesse de Saleh pelo cristianismo começou quando estudava em uma cidade distante da terra natal. Ele estava com medo de como a família responderia à fé recém-descoberta.
Quando reuniu coragem para falar ao pai sobre o interesse no cristianismo, descobriu que seu pai já era um seguidor de Cristo – e estava pronto para responder todas as perguntas que tinha. O pai escondera a fé do filho – uma prática comum na região, afinal os pais podem correr perigo caso os filhos revelem a outras pessoas outra fé que não seja o islamismo. No mesmo ano, Saleh decidiu seguir a Jesus.
Enquanto adolescente, Saleh tinha um sonho recorrente em que cantava em um palco e pessoas aplaudiam. Ele não entendeu até se tornar cristão. Quando começou a participar dos encontros da igreja, descobriu que seu pai compunha canções de adoração. Com ambos sendo seguidores de Jesus, Saleh e o pai decidiram gravar um álbum juntos com 13 faixas, todas cantadas por Saleh e escritas por seu pai. Foi quando Saleh entendeu o sonho: ele usaria seus talentos cantando para Jesus. Depois disso, também se tornou líder de igreja secreta no Iêmen.
Saleh e Fawzi, seu parceiro de ministério, eram conhecidos como “homens loucos” porque evangelizavam regularmente em frente à mesquita local. Isso os fez ser interrogados e acusados de apostasia (foto representativa)
Saleh e seu parceiro de ministério, Fawzi*, eram chamados de homens loucos na cidade. Eles evangelizavam regularmente em frente à mesquita local, uma atividade perigosa no Iêmen. Com o passar do tempo, expandiram o evangelismo e se aventuraram fora da cidade, viajando pelo país para espalhar a mensagem de Jesus. Mas a perseguição para esse tipo de ousadia é inevitável em um país como o Iêmen, com a pressão começando na cidade deles. Saleh e Fawzi foram interrogados e acusados de apostasia – uma acusação que pode levar à pena de morte.
Entretanto, parentes da tribo de Saleh o apoiaram. No Iêmen, isso às vezes importa mais do que outras coisas. Lealdade à linhagem tribal é uma das coisas mais importantes da cultura iemenita. Embora muitos na tribo desgostassem das atividades dele, hesitaram em confrontá-lo diretamente, muitas vezes chegando a ajudá-lo em situações difíceis.
Enquanto Saleh e Fawzi atravessavam o país, tiveram encontros surpreendentes. “Como novos cristãos e futuros líderes, tivemos a oportunidade de participar de treinamentos essenciais e workshops fora do Iêmen [alguns comandados por parceiros da Portas Abertas]. Os treinamentos nos prepararam para o ministério e ajudaram a nos aprofundarmos ainda mais na Bíblia”, disse Saleh.
Um dia, no aeroporto, enquanto se preparava para ir para um desses seminários, Saleh foi preso. “Uma onda de confusão e descrença me invadiu enquanto era levado a uma sala para interrogatório. As autoridades foram impiedosas em busca de respostas. Eles perguntaram se eu estava tentando deixar o país, quais segredos mantinha e se tinha relacionamentos com o Ocidente. Para minha surpresa, ao invés de me deterem, os agentes me fizeram uma proposta. Eles pediram que me juntasse a eles, pois acreditavam que eu seria um recurso valioso”, relembra.
Saleh recusou, se desculpando por declinar da oferta de emprego. Ele disse: “Eu sou um fazendeiro humilde. Meu coração deseja uma vida simples. Não tenho nada a ver com o mundo militar e da segurança. Esse ramo não é para mim”. Depois desse incidente, Saleh permaneceu no Iêmen e passou a participar dos discipulados e treinamentos de maneira online. “Eu louvo a Deus pelos encontros online, afinal, às vezes, são a única alternativa para sermos treinados e preparados”, ele diz.
Saleh começou uma rede de igrejas domésticas no Iêmen, onde cerca de 70% dos cristãos não se encontram regularmente por segurança ou por não conhecerem outros cristãos (foto representativa)
Em determinado momento, Saleh teve que fugir do Iêmen por causa da guerra, não pela perseguição. “Quando a casa ao lado da nossa foi atingida por um míssil, a pressão do impacto quebrou todas as nossas janelas. Ainda assim, milagrosamente, ninguém ficou ferido. Poucos dias depois, nossa caixa d’água foi atingida por outro míssil e, novamente, de forma impressionante, sobrevivemos. Mas dessa vez decidimos que era o momento de sairmos”, disse.
Ele foi de barco para um país vizinho e, após chegar lá, ficou em um campo com muitos refugiados iemenitas. Lá, falou abertamente sobre Jesus e muitos vieram a Cristo. “Eu fiquei conhecido como ‘a pessoa que conhece Jesus’. As pessoas tinham interesse em falar, ouvir e debater comigo. Nós conversávamos por horas. Tive conversas profundas e muitas pessoas conheceram a Cristo. Também encorajei os que queriam voltar para o Iêmen para servir lá”, disse.
O Iêmen sempre esteve no coração e na mente de Saleh. Ele ama sua terra e começou a perguntar a Deus como poderia continuar alcançando o Iêmen para Jesus. Então decidiu começar uma rede de igrejas domésticas em seu país. Cerca de 70% dos cristãos no Iêmen não se encontram regularmente, por motivos de segurança ou por não conhecerem outros cristãos. Igrejas domésticas são a única forma de comunhão.
“Nós começamos uma igreja em uma área ‘mais segura’ onde líderes podem se reunir, estudar a Bíblia, orar, serem encorajados e treinados e iniciarem um ministério”, disse. Como Saleh sabe, qualquer tipo de trabalho para Jesus no Iêmen carrega um risco, mas ele diz que vale a pena. “Se ficássemos em casa, seria mais seguro. Mas que tipo de cristãos seríamos se não arriscássemos nossa vida para que outros conheçam a vida?”, disse.
Saleh passou a viajar para estabelecer e fortalecer a igreja, o que resultou em ameaças de morte recebidas por telefone (foto representativa)
Saleh entrava e saía do país a fim de estabelecer e fortalecer a igreja no Iêmen. Mas por causa de ameaças de morte recebidas por telefone, ele precisou ficar escondido no Iêmen. Mesmo assim, Deus usou a igreja para brilhar nos momentos escuros de Saleh. A montanha-russa de dias bons e ruins amadureceu seu relacionamento com Jesus.
Quando o perigo diminuiu, Saleh pôde sair do país e voltou a morar fora do Iêmen. Mas atualmente, ele continua viajando para o Iêmen e outros países onde iemenitas vivem. Seu objetivo é discipular, ensinar, encorajar, ouvir, ajudar e pastorear. “A igreja no Iêmen vive em condições difíceis, mas cresce mesmo assim”, compartilha.
“Eu espero que em breve haja cristãos em cada canto do país, que em cada vila e cidade eles saiam para compartilhar o evangelho em palavras e ações. Meu sonho vai além das fronteiras do Iêmen. Eu oro para ver a igreja se espalhando para fora do Iêmen, para partes da África, para o resto da Península Arábica”, conta.
O risco contínuo não impede Saleh de seguir o chamado de Deus. Seja enfrentando uma guerra perigosa, interrogatórios no aeroporto ou ameaças de morte por telefone, ele continuará seguindo o caminho de Jesus. “Eu geralmente sou chamado de louco, porque os cristãos iemenitas sabem das ameaças que recebo e o que acontece comigo. Tudo isso renova minha determinação e encorajamento para proclamar a mensagem de Cristo no Iêmen. Precisamos de servos corajosos para proclamar a mensagem de Deus nesse país”, ele conclui.
*Nomes alterados por segurança.
Com a guerra, as pessoas no Iêmen não têm condições de comprar comida. Sua doação garante alimento a um cristão que enfrenta perseguição extrema no Iêmen, ajudando sua família a sobreviver.
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