Portas Abertas • 19 dez 2018
Maioria da população russa é cristã ortodoxa, mas católicos e protestantes são vistos como ocidentais e estrangeiros
Na Rússia, cristãos são perseguidos desde a época da União Soviética. O que aconteceu à família Popov, uma das milhares de famílias de cristãos russos, foi comum na igreja secreta durante o tempo soviético. Essa história é contada por um dos filhos de Nicolai e Nadezhda Popov:
Minha mãe, Nadezhda, que significa esperança, atualmente tem 79 anos e eu admiro muito ela. Meus pais tiveram muitas dificuldades. Durante o período da União Soviética, meu pai passou 10 anos na prisão e minha mãe criou nove filhos basicamente sozinha, enquanto o marido estava na prisão ou em campos de trabalho.
Enquanto meu pai esteve na prisão, ela carregou um fardo duplo: cuidar das crianças e do meu pai. Ela também participou do “Conselho de Parentes de Prisioneiros” dos Cristãos Evangélicos e Batistas (ECB, da sigla em inglês). O conselho teve início em 1964 e cuidava dos interesses dos prisioneiros da ECB. Eles publicavam regularmente listas com os nomes dos prisioneiros e também cuidavam de seus parentes. Irmãs, esposas e filhas de cristãos presos se reuniam, passavam informações sobre prisioneiros, forneciam ajuda física e espiritual para eles e suas famílias, e conseguiam pacotes de comida.
De 1961 até 1988, houveram centenas de prisioneiros e alguns mártires. Entretanto, haviam milhares de pessoas desconhecidas, como minha mãe, que permaneceram firmes fielmente durante os tempos de perseguição. Livros não foram escritos sobre eles, mas foram e ainda são pilares da Igreja Perseguida. Para manter meu pai informado sobre o que acontecia na igreja e no mundo, ela fez um acordo que escreveria bilhetes em pequenos pedaços de papel e costuraria nas mangas e colarinhos de suas camisas. Tudo que chegava na prisão era vistoriado e censurado, mas essa era uma das formas de passar informação para ele durante o tempo antes do julgamento. Quando alguém era condenado, tinha que ir para um campo de trabalho e vestir as roupas da prisão, a partir de então essa forma de comunicação não era mais possível.
Meu pai esteve em detenção pré-julgamento por três vezes, todas duraram cerca de seis meses. Durante aqueles meses, minha mãe conseguia mantê-lo informado sobre a família, igreja e a situação de fora. Isso era vital para meu pai, que se sentia isolado enquanto afastado da família e igreja.
Com frequência imaginei o que a mantinha e recentemente ela me disse: “Fé e confiança no Senhor me sustentaram durante esses 10 anos de prisão do meu marido por conta da fé. Deus esteve muito perto de mim durante esse período. Eu estou muito bem espiritualmente. Durante toda minha vida cristã, não senti tanta proximidade de Deus como durante esses anos”. As igrejas perseguidas e cristãos do ocidente ajudaram essa família com orações e material de ajuda. Dessa forma se lembravam de que não estavam sozinhos, mas que faziam parte de uma grande família, o corpo de Cristo.
Os bolcheviques eram um partido revolucionário, dedicado às ideias de Karl Marx. Eles acreditavam que as classes trabalhadoras poderiam, em algum momento, se libertar do controle econômico e político da classe dominante. Uma vez que alcançassem isso, uma sociedade socialista genuína baseada na igualdade, seria estabelecida.
Os bolcheviques formaram uma Ditadura do Proletariado para manter o poder até a Rússia se modernizar. O proletariado era o apoio oficial dos bolcheviques e costumavam ser trabalhadores da indústria.
Na época da Revolução de 1917, que derrubou o czar, os bolcheviques ainda estavam relativamente fracos. A maioria dos líderes, incluindo Lenin, estavam exilados na Suíça. As chances deles um dia alcançarem o poder na Rúsia pareciam remotas. Mas no final de 1917, Lenin, o líder bolchevique, decidiu que as condições na Rússia estavam prontas para a revolução.
A revolução soviética foi conduzida pelos bolcheviques e liderada por Vladimir Lenin após uma sangrenta guerra civil que incluiu a execução do czar Nicholas II e sua família, em 1917. O novo estado socialista de Lenin confiscou as propriedades, terras e recursos da igreja. Muitos líderes da Igreja Ortodoxa Russa foram mortos ou simplesmente “desapareceram”. Centenas de Igrejas Católicas Romanas foram obrigadas a fechar, embora igrejas batistas e pentencostais passaram de 150 mil para 700 mil.
Durante o tempo de Lenin no poder, a União Soviética teve origem, em 1922. Era a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) com a Rússia como seu estado maior e mais populoso. Apesar de todas as reformas religiosas durante seus sete anos no poder, Lenin concluiu: “Nós separamos a igreja do estado, mas nós não separamos as pessoas da religião”.
Quando a União Soviética colapsou em 1991, o governo comunista acabou. O ateísmo não era mais propagado e a perseguição religiosa do Estado chegou ao fim. Todos os prisioneiros religiosos foram libertos e a vigilância a cristãos e igrejas foi interrompida. Se tornou normal para os russos se identificarem com religiões novamente e até mesmo oficiais do estado podiam fazer isso. A Igreja Ortodoxa Russa tenta desde então reconquistar sua posição dominante na sociedade, mas a Rússia permaneceu oficialmente como um estado secular.
Os russos são muito orgulhosos de sua cultura e história e isso tem consequências também no nível religioso. Enquanto os ortodoxos são considerados tipicamente russos, o catolicismo romano e principalmente o protestantismo são vistos como ocidentais e estrangeiros.
Atualmente, dos 144 milhões de habitantes, cerca de 82,1% são cristãos, segundo a estimativa do World Christian Database. Desses, 96,6% são ortodoxos russos.
Irmão André durante entrega de um milhão de Biblias em uma Igreja Ortodoxa Russa, em Moscou
A Rússia era governada por czares que tinham a autoridade máxima em todas as questões do governo. O czar era o chefe da Igreja Ortodoxa Russa e a igreja apenas reforçava sua autoridade. A doutrina oficial da igreja declarava que o czar era escolhido por Deus. Qualquer desafio ao czar era tido como um insulto a Deus.
A igreja era muito influente entre a grande população mais pobre. É claro que essa mensagem era regularmente transmitida para eles. Sacerdotes explicavam para seus seguidores que a Rússia era a terra de Deus e ele queria que a vida fosse do jeito que já estavam.
A igreja dava recompensas financeiras ao czar por essa propaganda. A maioria da população russa era iletrada e e tinha que confiar no que era dito pela igreja. Era sua única fonte de educação e eles costumavam acreditar nos ensinamentos dos padres.
Porém, desde o colapso da União Soviética, o papel da Igreja Ortodoxa Russa se transformou drasticamente. A igreja agora se tornou uma característica que define a identidade russa e é ativamente promovida pelo Kremlin, governo russo.
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